segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Petróleo: onde estamos?

Enquanto se aguarda, lá para Novembro, a publicação do World Energy Outlook 2010, o relatório anual da AIE - Agência Internacional de Energia - que analisa a situação mundial da energia, o tempo é propício às reflexões sobre o tema, e que já começam a surgir nos sites especializados.

No oildrum que é o mais importante espaço da Net onde se debatem estes temas, e como que a antecipar a discussão para os números do WEO 2010, começaram já a aparecer as primeiras análises desta temporada. Em particular sobre a situação do mercado mundial do petróleo, o combustível fóssil cujas variações de preço mais condicionam a economia mundial. Trata-se de avaliar a evolução da produção, o estado das reservas, a capacidade de produção excedentária, e as perspectivas de curto e médio prazo. E, claro, a previsível evolução dos preços da maéria prima, que é o factor mais crítico para a tão desejada retoma da economia.

Em Agosto passado, de autoria de Rune Likvern foi aí publicado um interessante trabalho sobre a situação internacional de mercado, o qual foi actualizado já em Setembro. A conclusão mais importante é de que, no final de 2011, poderá estar esgotada a capacidade de reserva de produção (spare capacity) dos países da OPEC, e que, por essa razão, o mundo poderá vir a enfrentar um novo choque petrolífero. Ou, se preferirem, poderá agravar-se o choque de 2008, do qual ainda não saímos. São péssimas notícias para aqueles que buscam, a todo o custo, afastar o fantasma da recessão económica.

A produção mundial de petróleo (que incluiu todas as formas em que ele chega às refinarias, crude, condensado, derivados líquidos do gás natural, biofuel…) estacionou, desde 2005, no plafond dos 85 milhões de barris diários. E isto depois de décadas de crescimento contínuo, apenas interrompido pela crise dos anos 80, que nos levaram a criar a ilusão de que as cornucopianas previsões dos organismos internacionais eram sensatas e realizáveis.

No ano de 2008 atingiu-se o preço record de 140 dólares por barril, na bolsa de Nova York. E, estranhamente, o aumento de oferta que isso induziu foi muito pequeno e localizado na Arábia Saudita, no Kwait e nos Emiratos Árabes Unidos. Terá sido isto um sinal de que, naquele momento, se terá atingido, ou se terá ficado muito próximo da capacidade máxima de produção? A resposta, tudo indica, só pode ser afirmativa.

É certo que, por força da crise, nos países da OCDE, o consumo de crude baixou, nos últimos 2 anos. Mas ao mesmo tempo, o consumo nos países fora da OCDE teve uma forte subida. E aqui destaca-se o aumento de consumo na China que vai prosseguir inexoravelmente, impulsionado pelo forte crescimento da sua economia. E até os próprios países da OPEC, animados pelo forte aumento de receitas, crescem, e passam, eles próprios, a consumir mais petróleo.

Para sair da situação de crise, o mundo precisa urgentemente de mais energia barata e facilmente disponível. No contexto actual, caracterizado pela ausência de alternativas energéticas para os transportes, o petróleo desempenha um papel crucial, e todas as análises convergem na conclusão de estamos no "pico de produção" ou muito próximo dele. E por muita boa vontade que se queira ter, começamos a desesperar por não se ver a luz ao fundo do túnel.

Acho oportuno citar Gail Tverberg, editora do oildrum: “Estamos a aproximar-nos de um tempo em que ou se tem petróleo ou se tem alimentos para trocar por petróleo. Pior estarão aqueles países que vivem do turismo ou dos serviços financeiros que não vão ter nada para a troca”.

O nosso país, infelizmente, não tem petróleo e não produz alimentos. Mas – a acreditar nos nossos governantes - temos o estado social que (julgam eles) nos vai salvar a todos.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Transição e o Estado Social

Com o agravar da crise, a economia estagna, o desemprego sobe, e as contas do Estado ameaçam derrapar. E com o índice de envelhecimento da população a aumentar, surge a necessária e inevitável pergunta: será possível, no futuro, manter o "estado social" nos moldes em que ele funciona actualmente?

Quando falo em “estado social”, refiro-me ao papel do Estado como garante das pensões de reforma, dos subsídios de todo o tipo (desemprego, maternidade, inserção social, doença…), do serviço nacional de saúde, da educação gratuita e universal. Garantias estas que representam uma espécie de seguro a favor dos mais velhos, dos doentes e dos mais carenciados, e cujo prémio é pago nos impostos suportados por todos os cidadãos. Mas que, em última análise, dependem do bom desempenho da economia e da contribuição da população activa.

Em Portugal, tal como nos outros países europeus, vigora o sistema "pay as you go". Em cada momento, as prestações sociais são pagas pela população activa, ou pela fiscalidade incidente sobre a economia. Significa isto que os nossos descontos para a Segurança Social não vão servir para pagar as nossas pensões no futuro. Eles servem para pagar as pensões dos reformados actuais, ao passo que as nossas irão ser pagas pelas novas gerações. Se houver dinheiro, claro.

Os custos sociais têm tendência a aumentar sempre, e isto acontece como resultado do envelhecimento da população, dos valores, sempre crescentes, das pensões dos novos beneficiários, do aumento do desemprego, da antecipação das reformas. Quando a economia cresce, o aumento da receita fiscal pode ser suficiente para compensar essa subida. Caso contrário, isto é, se não houver crescimento da economia, a tendência será para se criar um deficit social.

Em Portugal, o deficit social será suportado pelo orçamento do Estado, e pode implicar, por sua vez, um agravamento do deficit orçamental. E quando isso acontecer, tal só poderá ser compensado pela ajuda do exterior ou pelo aumento do endividamento público. Enfim, trata-se de uma cadeia perigosa que poderá conduzir a um empobrecimento contínuo, e, no limite, à insolvência do próprio Estado.

O estado social é uma grande conquista da Europa do pós guerra. Mas é a consequência de uma economia de excedentes, ela própria consequência de um crescimento continuo decorrente da globalização e da abundância energética. Mas isso não irá continuar, razão pela qual, na Europa, já começam a confrontar-se duas ideias inconciliáveis: o estado social, tal como está, ou a economia viável.

Na transição, as pessoas vão ter de trabalhar mais e durante mais tempo, as pensões vão reduzir-se, tal como os subsídios. Vai ser o tempo exigente de pôr à prova o bom senso dos homens que nos governam, e a sua capacidade de fazer evoluir o actual sistema para um novo tipo da solidariedade.