segunda-feira, 1 de outubro de 2012

A Alma de Almeida!


Uma região fortemente deprimida como é o caso do Concelho de Almeida, com grande escassez de recursos, com a população envelhecida, e onde foi destruído o modo de viver tradicional, necessita urgentemente de encontrar o caminho da sobrevivência. De outro modo, e uma vez esvaziadas do seu património humano ativo, estas regiões correm o risco de se desertificar, e passar a ser um alvo fácil para usos marginais, tais como albergar lixeiras, atrair indústrias poluentes ou transformar-se em coutadas de caça. A opção pelo turismo como motor de desenvolvimento só funciona se existirem condições para atrair turistas e fixá-los com alguma permanência. Almeida tem condições para os atrair mas não para os fixar. As termas da Fonte Santa poderiam ser esse atrativo mas não parece que se dirijam a um alvo capaz de criar uma procura sustentável. Não têm dimensão crítica, não existe a componente hoteleira e, além disso, têm carácter de sazonalidade. E a crise atual, com restrições à mobilidade, também não favorece o sector do turismo.

Incentivos ou apoios, para promover iniciativas locais, quando não tiverem o devido acompanhamento ou seguimento, funcionam muitas vezes como balões de oxigénio, e também não têm servido para dinamizar, de forma sustentada, as regiões mais deprimidas. As construções de infraestruturas (auto estradas, rotundas, pavilhões), embora promovam temporariamente a atividade económica e o emprego, acabam por ter o um efeito reduzido, a prazo, sobre o desenvolvimento territorial, e, em muitos casos, são subutilizadas.

Uma outra solução pode ser a de criar zonas com uma vocação específica e com atrativos fiscais e apoios financeiros, as chamadas "zonas francas". Segundo a definição da Wikipédia "Uma zona franca é uma região "isolada e delimitada" dentro de um país, geralmente situada em um porto ou nas suas proximidades, onde entram mercadorias nacionais ou estrangeiras sem se sujeitar às tarifas alfandegárias normais. O objetivo consiste em estimular as trocas comerciais, em certos casos para acelerar o desenvolvimento regionall. São lugares onde o governo estimula a criação de empresas e indústrias com a redução dos impostos e apoios financeiros."

É uma definição genérica e tem de ser adaptada caso a caso. O espaço intramuros de Almeida obedece à condição essencial de uma zona franca pois trata-se de uma "região delimitada e isolada". Não está junto de um porto, mas está junto da principal fronteira terrestre do país. E, sendo o objetivo da zona franca acelerar o desenvolvimento regional, a opção ajusta-se perfeitamente a este caso. Mas Almeida, pelas suas características, não parece apta a ser uma zona franca industrial. A melhor opção, na minha proposta, será a de criar uma zona franca cultural. Este conceito não é novo e tomei conhecimento da sua aplicação ou tentativa de aplicação (em formatos distintos) na China, no Brasil, no Chile e na Colômbia. A minha ideia de zona franca Cultural aponta para a Cultura não tanto pelo seu aspeto comercial mas algo mais importante: o seu valor intrínseco. 

A propósito de uma ideia de criação de uma zona franca cultural, em Valparaíso, no Chile, surgida num jornal, um leitor opina de uma forma que ilustra as duas visões de cultura:
" Li atentamente a nota de H. Veliza em resposta aos comentários que fiz a uma nota sua anterior, na qual lançava a ideia de legislar no sentido de criar em Valparaíso uma Zona Franca Cultural. Depreendo da sua nota que artes e cultura são, por nós, entendidas de modos diferentes. Digo isto porque a proposta do meu interlocutor se centra na associação entre "investimento-rentabilidade e turismo", ao passo que a minha ideia se aproxima mais em considerar nas artes e na cultura o seu "valor de uso" . Por outras palavras, o Sr. Veliza não resiste à tentação, hoje tão em voga, de coisificar as artes e a cultura fazendo prevalecer o seu "valor de troca" minimizando o seu espírito, aquilo que lhe é intrínseco" (ler aqui o texto completo do comentário)
 Uma forma equilibrada de conciliar o "valor de troca" e o "valor de uso" terá de ser a solução para o caso de Almeida. O primeiro passo consistirá em criar condições para atrair artistas, escritores, músicos, atores, criando para tal incentivos, que podem ser de vários tipos.  O segundo passo, é desenvolver o conceito de zona franca cultural adaptado a este caso, visando atrair o público com base na organização de eventos culturais (valor de uso) sem esquecer o comércio associado à arte (valor de troca)

Esta proposta aqui apresentada, apenas como esboço, deveria de imediato ser acarinhada e desenvolvida pela edilidade, criando um grupo de trabalho para a desenvolver, grupo esse que deveria ser o mais abrangente e diversificado possível na sua composição. Caberia  a esse grupo estruturar o conceito e preparar uma proposta com vista a preparar a legislação adequada.

Uma vila que no dizer de um anterior Presidente da Câmara fica no "interior do interior", tem de fazer opções de rutura. E essa rutura poderá ser a criação de uma zona franca cultural. Não é fácil enfrentar o desafio, e é necessário, em primeiro lugar, acreditar nele. Acredito que vontades não faltarão mas vai ser preciso coordená-las. Na verdade trata-se de redescobrir a Alma de Almeida!

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