segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

O Choque

A publicação do relatório do FMI e o tratamento que  lhe foi dado pelos meios de comunicação social deixou os portugueses em estado de choque. Esta revelação fez-me lembrar aqueles momentos em que o médico diz a um doente que tem uma doença grave ou incurável. O doente primeiro recusa a verdade, ficará angustiado e tentará mitigá-la.  Mas depois revolta-se, em seguida deprime-se, e, finalmente, aceita.  O doente é Portugal, quer dizer somos todos nós; o FMI é o analista que traz o boletim de análise; médico ainda não temos pois ainda ninguém arranjou coragem para assumir esse papel. Todos, incluindo os membros do governo, teimam em ignorar ou fingir ignorar o assunto, e demitem-se de ser os mensageiros das más notícias.

Não vale a pena negar a evidência. Portugal é um país pobre (sempre foi!) que nas últimas décadas se deixou iludir por uma falsa promessa de prosperidade. Mas os comentadores e muitos políticos ainda teimam em negar isso. Que não, que tudo estaria bem se não fosse o BPN, se não fossem as mordomias dos políticos, se não fosse o esbanjamento dos governantes, se não fosse a ganância dos bancos... Ora, tudo isto, sendo porventura algumas das causas dos problemas ou tendo contribuído para os agravar, não é o suficiente para equacionar esses problemas, e, muito menos, para os resolver.

Deixemos que o tempo da negação se consuma e acautelemos a revolta que se vai seguir. A revolta muitas vezes é cega e má conselheira. Retira-nos a lucidez e leva-nos a cometer atos desesperados. Matar o mensageiro pode ser a tentação. Serenar os ânimos, aconselhar calma, chamar à razão é  aconselhável para evitar excessos. Aos mais lúcidos, aos senadores da Pátria, competeria essa função. Mas temos assistido a comportamentos contrários, gente com responsabilidades que vem atear o fogo em vez de deitar a água na fervura.

Quando a depressão se instalar, quando a descrença dos portugueses for generalizada, viveremos um tempo ainda mais incerto e perigoso. Será o momento em que as pessoas pensam mal e se agarram desesperadamente a tábuas de salvação sem cuidar de avaliar os riscos. Podem, nessa fase, ser cometidos erros grosseiros e com consequências muito gravosas. Aparecerão, lado a lado, os profetas da desgraça e os profetas da esperança (uns e outros oportunistas!), haverá dificuldade em distinguir entre o sábio e o charlatão.

Quando, finalmente, se chegar à fase da aceitação talvez se criem condições para reencontrar o caminho ou a via alternativa. Esse poderá ser o caminho da Transição. A nossa esperança coletiva está, pois, num renascimento, o qual terá de ser um tempo de outras regras e muita disciplina, de novas ideias e de novas mentalidades. Um caminho muito estreito, em todo o caso.

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