segunda-feira, 20 de outubro de 2014

O Elevador Social

Há quem critique os pastores
por eles não serem estudados
Se fossem todos doutores
que seria dos nossos gados?
 Quadra afixada numa queijaria da Beira Baixa
Autor desconhecido



Nos anos 30 do século passado, uma vez estabilizadas as finanças públicas, Salazar idealizou para Portugal um modelo de sociedade corporativa assente na boa ordem social, no amor da Pátria,  na família e na tradição católica. O condicionamento industrial visava preservar a concorrência desenfreada e proteger os grupos económicos em ascensão. Portugal continuaria, pois, a ser um país essencialmente rural. As colónias eram ainda vistas como mercados de exportação e fontes de matérias primas.  As elites governantes da República radicavam na indústria e  na agricultura latifundiária, mas estavam em ascensão as hierarquias militares e académicas.  A educação superior destinava-se aos jovens provenientes dessas  elites. Para as massas populares bastava aprender a lêr, escrever e contar. Ocasionalmente, o seminário - tinha sido o caso do ditador - entreabria uma estreita via de acesso às camadas superiores.

Mas o mundo no pós guerra  passava por transformações muito profundas que se não  compadeciam com este bucólico modelo. Estava a ocorrer a segunda revolução industrial, a da mobilidade, que iria transformar radicalmente a forma de viver das sociedades ocidentais. O automóvel iria provocar o desenvolvimento das cidades, a mecanização e os fertilizantes estavam a  transformar a agricultura. O mundo entrava aceleradamente na era da globalização. O desenvolvimento atraía a Portugal as grandes multinacionais, favorecia-se o consumismo. Nesse período, florescem as atividades ligadas à banca e aos seguros, nasce o marketing e as funções com ele relacionadas: vendas, publicidade, merchandising, estudos de mercado. Emergem novas e mais sofisticadas formas de distribuição dos produtos. A rádio primeiro,  a televisão depois generalizam-se; empregam gente e afirmam-se como poderosos meios de comunicação e de publicidade.

Fruto do desenvolvimento, cresce o emprego e surgem novas profissões que requerem novas exigências. O acesso à educação explode nos anos 60. Como consequência, os campos começam a esvaziar-se. A educação transforma os filhos dos agricultores em doutores que passam a relacionar-se e a conviver, de igual para igual, com os filhos das velhas elites. A partir dos anos sessenta do século passado, o acesso das camadas menos favorecidas à universidade foi a causa principal para a criação de novas elites. A educação foi  o elevador social que favoreceu a ascensão.

Em abril de 1974, o Portugal que fez a revolução dos cravos era já um país diferente . E foram já, em grande parte,  as novas elites que assumiram o poder e a liderança. Durante as décadas que se seguiram,  foram criadas novas universidades, proliferaram os cursos. Os mais jovens, que aspiravam a seguir a carreira dos pais, habituaram-se a ver no diploma o passaporte para o emprego e para o sucesso.  Ser engenheiro, economista, médico ou professor era sinónimo de emprego garantido.

Com a crise as coisas mudaram e o diploma deixou de ser garantia de emprego. O elevador social está fechado à chave -acessível a muito poucos -, ou só conduz à cave. Entretanto os lugares na  base da pirâmide foram ocupados por imigrantes e aos jovens licenciados resta-lhes, em alternativa ao desemprego, a emigração.

Chegou o momento de rever o papel da educação. Nós temos de formar a geração que vai fazer a Transição. As palavras de ordem terão a ver com sustentabilidade e responsabilidade. Vai ser preciso formar jovens com capacidade critica e com criatividade.  Será preciso mudar os valores no sentido que um dia Ernâni Lopes apontou, substituindo aqueles que, passo a citar, "hoje lhes servem de referência, que mostram que para se ter sucesso – poder e dinheiro – o trabalho, a honestidade e o conhecimento não fazem falta."
E foi aquele economista que nos deixou a tabela da conversão do que é para o que deve ser:
Facilitismo ------- Exigência
Vulgaridade ------ Excelência
Ignorância -------- Conhecimento
Mandriice -------- Trabalho
Aldrabice ---------Honestidade
Videirismo ------- Honra
Golpada ---------- Seriedade
Moleza ----------- Dureza

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