segunda-feira, 13 de abril de 2015

Deus e a Flor

Quando, na idade dos porquês e influenciado pelas aulas de catequese, um dos meus filhos me perguntou: - Pai, Deus existe? , senti a pesada responsabilidade da resposta (fosse ela qual fosse!) e optei por focá-lo no problema. - Filho, esta é uma resposta que tu próprio vais ter de encontrar. E confrontei-o com as paradoxias da criação da Matéria, da origem da Vida, e da centelha que foi o aparecimento da Inteligência nos humanos. Só não lhe falei da Morte! – uma criança não entende a Morte - e do mistério que ela encerra. Ele, pensativo, anuiu que sim, que Deus deveria existir, mas acrescentou um desabafo de racionalidade bíblica: - Só que já para aí há uns dois mil anos que ele não faz nada, não achas?!

Esta história faz-me lembrar outra de um amigo, católico praticante, que me confessava a sua dificuldade em admitir como é que Deus, no dia do Juízo Final, iria julgar tantos milhões de seres humanos, sendo que cada um teria o seu processo individual, com o direito a apresentar as suas razões, a justificar os seus atos, a invocar as suas atenuantes...Estou a referir-me, claro, ao Deus dos judeus que, incarnado em Cristo ou exprimindo-se pela palavra de Maomé, tanto influenciou - e continua a influenciar - a Humanidade.

Primeiro, Galileu destronou a Terra como centro do mundo; depois, Darwin questionou o Homem como o eleito da criação; finalmente Freud mostrou a fragilidade da alma humana. E, à medida que vamos penetrando nas profundezas do Universo, que percecionamos a sua imensidão e antevemos muitos outros mundos vivos - e inteligentes! -, para além do nosso, parece fechar-se o espaço para esse Deus. A causa disto reside na crença de que Deus criou o Homem à sua imagem, quando o que aconteceu foi exatamente o contrário: o Homem criou Deus à sua imagem. E como o Homem e a sua imagem estão a mudar - e de que maneira! - Deus vai ter também de mudar.

Mas, à medida que se reduz o espaço para Deus no Universo, parece ampliar-se o espaço para Deus dentro da mente dos homens. A inteligência deu ao homem a capacidade de fazer escolhas, o livre arbítrio. Ora, é nas escolhas que o homem se confronta com o divino, pois em cada escolha o homem está confrontado com o seu Eu, com a sua Mente e com Deus. Este Deus interior tem de ser ativamente procurado - pode até ser necessário construí-lo! -, ele é uma parte desse éter que tudo enforma, que tudo explica, que é positivo, criador, inspirador e fonte de Vida.

Hoje, não sei se teria respondido da mesma maneira ao meu filho. Talvez lhe tivesse pegado na mão e o tivesse levado a procurar a flor mais singela do campo e lhe tivesse dito - Deus está dentro desta flor, vamos ver se conseguimos descobri-lo!

Encontrar Deus dentro de si próprio e, com sacrifício do Eu, saber dar-lhe expressão nas escolhas da vida, é próprio da natureza dos homens bons, dos sábios e dos santos.


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