terça-feira, 21 de abril de 2015

Encontro de Gerações

A minha envolvência com os programas Nepso e Rato de Biblioteca da Fundação Vox Populi, dirigidos às escolas, aproximou-me dos jovens alunos e de jovens professores. Isso tem sido uma coisa boa, pois aprendo com eles, ao mesmo tempo que me vou dando conta dos seus problemas, das suas angústias e das suas inseguranças. Os jovens são a única esperança duma Europa envelhecida, decadente e desorientada. E, muito em particular, do nosso país, onde esses fatores estão bem presentes. Nestes contactos apercebo-me que está a erguer- se um muro no caminho da vida destes jovens, e que a desorientação se apodera deles. Não se lhes traçou um rumo, faltam crenças e valores, existe um vazio espiritual, que o espaço aberto pelas redes sociais colmata em parte - não sei se para bem se para mal! -, mas não consegue preencher.

A geração dos mais velhos, que cresceu no pós guerra e viveu a euforia da era da urbanização e da alegre motorização, acreditou que o festim do crescimento continuaria indefinidamente. Como consequência dessa crença, os filhos e os netos desta geração foram preparados - pela família, pela sociedade e pela escola – para o que se acreditava ser um mundo consumista, pleno de oportunidades, facilidades e empregos. Mas com o aproximar do fim da idade da abundância - de que a crise iniciada em 2008 foi apenas o primeiro sinal - está a agudizar-se a dissonância e a aumentar o gap entre a geração dos mais velhos e dos mais jovens.

Estamos a dar-nos conta que os jovens não têm empregos nem perspectivas de o conseguirem, não encontram caminhos, desesperam, olham para o exterior e procuram emigrar. Quando o conseguem, deixam atrás de si uma terra abandonada, com menos esperança e com o seu futuro ainda mais comprometido. Já ninguém fala de patriotismo, desvanecem-se as tradições, diluiu-se a cultura, despreza-se a religião. Estamos, tranquilamente, à espera que alguém venha ocupar o território desertificado...

Até meados do século passado, na Europa de economia predominantemente rural, os filhos eram um ativo. Nas famílias numerosas a solidariedade intergerações protegia os mais velhos e os mais necessitados. Com o advento do Estado Social, os filhos continuam a ser um ativo sentimental, mas passaram a ser um passivo económico. Já não contam para amenizar a velhice e, antes pelo contrário, esperam dos pais o apoio que a sociedade lhes começa a negar. E muitos já começam a descrer da família como aspiração e projeto de vida.

Neste contexto, a questão do envelhecimento - ou se quiserem do decréscimo da natalidade - preocupa os governantes. Estamos agarrados a velhas crenças, acreditamos que tudo voltará a ser como dantes. Existe até a ilusão de que poderá haver uma inversão natural da tendência da quebra da natalidade. Ora isso nunca poderá acontecer de forma espontânea, pois a sociedade está a sofrer de uma grave doença degenerativa, de difícil tratamento e prognóstico pouco favorável. Meter a cabeça na areia não vai resolver o problema.

Vivemos numa encruzilhada da Civilização. O crescimento devorou recursos, aumentou a poluição e acentuou os desequilíbrios ambientais. Os povos dos países emancipados no pós guerra vieram sentar-se à mesa do banquete e disputam as benesses do crescimento, e reclamam a sua parte do bolo da riqueza económica. Fora da Europa, produz-se mais e vive-se pior. E, paradoxalmente, dentro da Europa produz-se menos e vive-se melhor. Só que isso não vai durar sempre...

Deixamos, é certo, aos nossos filhos a promessa de uma vida mais fácil e um vasto património que eles vão ter de manter. Mas que valores, que crenças e que rumo lhe apontamos? Quais os caminhos que lhe mostramos? A educação para o sucesso e para a competitividade deu-lhes armas que pouco lhes irão servir na luta pela sobrevivência num mundo perigosamente minado.

Chegou a hora de começarmos a preparar o Encontro de Gerações.


1 comentário:

  1. Que belo texto e que excelente apresentação de um gravíssimo problema de que os políticos não falam, por serem medíocres e só saberem navegar à vista. O navio está desgovernado e à deriva. Estamos realmente ameaçados por um naufrágio.

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