segunda-feira, 22 de junho de 2015

Um Longo Caminho

Foi há cerca de seis anos que comecei a publicar textos neste blogue. Um tempo que passou veloz, em que muita coisa aconteceu e se percorreu um longo caminho. Em 2009, estava a generalizar-se a consciência sobre o pico do petróleo, a teoria de que as reservas de petróleo são limitadas e que um dia a sua extração começará a diminuir. Na peugada de Hubbert King surgiram diversos estudos de geólogos, engenheiros petrolíferos e outros analistas ligados aos assuntos do crude. De entre eles, destacaram-se o irlandês Colin Campbell e o francês Jean Lahérrère que, em março de 1998, tinham publicado na revista Scientific American um estudo seminal, The end of Cheap Oil, sobre as perspetivas de produção de petróleo para os anos vindouros. Uma nova geração de estudiosos, provenientes das mais diversas áreas, desde a sociologia à história, passando pela filosofia e pela antropologia, começavam a debruçar-se sobre as implicações da escassez dos recursos energéticos e a divulgar as suas conclusões. A internet permitia difundir a informação e fomentava a troca de pontos de vista. Foram os anos do despertar de consciências para a importância crucial da energia fóssil, o verdadeiro motor da era industrial. Recuperaram-se as ideias do Limits to Growth, publicado em 1972. Matt Simmons tinha acabado de publicar o Twilight in the Desert alertando para o iminente esgotamento das grandes jazidas da Arábia Saudita. De forma consensual, o diagnóstico para os anos seguintes era, claramente, pessimista. No blogue The Oil Drum, um fórum de discussão que foi uma referência para muitos, surgiram análises que pela sua acutilância e pertinência muito contribuíram para alterar de forma irreversível a minha visão do mundo.

A questão energética é central para a sociedade industrial. O século XX foi o século do petróleo e da mobilidade. O petróleo, tanto na Europa e Ásia Menor como no Pacífico, tinha desempenhado um importante papel nos dois conflitos mundiais. No final da II Guerra Mundial, os Estados Unidos firmaram acordos com a Arábia Saudita para assegurar o controlo das maiores reservas conhecidas. No período que se seguiu a 1945, o grande desenvolvimento económico, as transformações sociais e a febre da urbanização ficaram a dever-se à abundância energética. O grande dilema era que o crescimento, que a economia exigia, obrigava a dispor dessa energia de forma continuada e crescente. Em 1973, depois do embargo dos países árabes, constatou-se que só a disponibilidade de petróleo barato poderia assegurar esse crescimento. Nessa altura, os Estados Unidos, que já não eram auto suficientes, focalizaram toda a sua atenção no Médio Oriente. Começaram a preparar a ocupação do Iraque, considerado uma espécie de eldorado petrolífero, com potencialidades de produção semelhantes às da Arábia Saudita. E o pretexto para a conseguir iria surgir em setembro de 2001.

Marion Hubbert King, em 1956, foi o primeiro a alertar para a finitude das reservas de combustíveis fosseis e para o seu previsível esgotamento. Ora, como a economia exigia mais e mais energia, esta previsão era inconveniente. O engenheiro da Shell foi desacreditado e os seus avisos ignorados. Como resposta, os prospetores desenvolveram novas técnicas de pesquisa e os engenheiros começaram a cavar mais fundo e a rapar tudo o que ainda sobrava nas antigas jazidas abandonadas. Perfurou-se nas profundezas dos oceanos, esventrou-se a terra no Canadá, poluíram-se rios em Atabasca, enfrentaram-se os climas hostis do Alaska e do Ártico. Pelo petróleo, fizeram-se guerras, engendraram-se golpes de estado, minou-se até ao colapso a economia do antigo bloco de Leste. Na América, espremeu-se até à ultima gota a rocha xistosa do Texas e do Dakota. Entretanto, a necessidade de crescer conduziu à globalização e acelerou o despertar da China. E, assim, a ilusão do eterno crescimento era continuamente alimentada. Albert Bartlet ensinava que as consequências do crescimento exponencial não são bem percebidas pela mente humana. E a ameaça das alterações climáticas ia pesando sobre o destino da Civilização Industrial. A crise financeira de 2008 foi na sua essência uma crise de crescimento. Pouco a pouco, as pessoas começaram a tomar consciência que a Idade de Ouro - que se acreditava perpétua - poderia chegar ao fim.

A partir desta tomada de consciência, ganhou expressão uma corrente de pensamento orientada para as questões à volta do futuro da humanidade, e para o destino da espécie humana. Eu bebi dessas ideias: a filosofia, a antropologia, a astronomia, passaram a ser o centro dos meus interesses. Vi-me confrontado com as paradoxias - a origem da matéria, a origem da vida, a origem da inteligência, o destino do homem - que são as questões centrais do ser humano e que, na minha opinião, nunca serão cabalmente respondidas pelos mortais. Mas, cedo percebi que a humanidade se encontrava num processo de crescimento exponencial e que a economia comandava esse processo. A rapidez com que tudo estava a acontecer tornava mais difícil a perceção dos malefícios desse crescimento e camuflava as suas consequências. No entanto, pressentia-se que os riscos associados eram muito elevados.

Passados seis anos, continuo a perguntar-me onde estamos e para onde vamos. Resisto a partilhar, com algum otimismo, a generalizada crença de que, afinal tudo isto é normal, que não estamos perante o fim da história. Hesito em confiar que o homem mais uma vez vai encontrar remédio para todos os males. Continuo convencido que os pressupostos do Limits to Growth continuam válidos. E que as leis da física vão opor-se aos princípios da economia. Os números, os gráficos, os indicadores mostram que estamo-nos a aproximar dum turning point civilizacional.

À primeira vista, o acontecimento mais provável será um colapso económico provocado pela ausência de crescimento. Mas, a economia tem hoje um grande poder de adaptação a situações adversas. As soluções que encontra são aquilo que vulgarmente se designa de uma fuga para a frente. A resposta da economia estará no desenvolvimento da tecnologia, no reforço da economia digital, na promoção do consumo favorecida por novos acordos de comércio - como o TTIP e outros acordos regionais. Afinal, um aumento da complexidade, um reforço da globalização, a continuação da exploração dos recursos e o aumento da produtividade à custa do sacrifício da biodiversidade e do equilíbrio ecológico!

A pressão demográfica e os seus efeitos são outro fator de instabilidade a ter em consideração no futuro próximo. Grandes zonas do planeta - confinando com zonas economicamente mais desenvolvidas e de baixa natalidade - estão a ficar sobrepovoadas. São exemplos disso as pressões na margem africana do Mediterrâneo sobre a Europa do Sul, do Bengladesh sobre a Índia, do México e da América Latina sobre os Estados Unidos. A escassez de recursos tenderá a ser contrariada pelo aumento da eficiência na sua utilização e pela procura de fontes alternativas - energia solar, renováveis, acumuladores de grande capacidade. Porém, o problema persiste. O pico do petróleo foi relegado para segundo plano com a ilusão do shale oil americano. Mas, no essencial nada se alterou: acabou o petróleo barato, está a haver desinvestimento na prospeção, o petróleo ainda não tem substituto no sector da mobilidade. Existe muita incerteza, muita desinformação sobre o estado das reservas e sobre o grau de esgotamento das grandes jazidas... Pressinto que seremos, muito em breve, confrontados com um novo choque de graves consequências...

A economia vai continuar a agravar as desigualdades sociais entre países e dentro de cada país. Muitas das conquistas sociais dos países desenvolvidos - proteção na saúde, no desemprego, direitos assegurados na educação, etc. - vão ser reduzidas à medida que a taxa de criação de riqueza for diminuindo, à medida que a esperança de vida for aumentando e à medida que a criação de novos postos de trabalho se reduzir. Será também este um um fator de instabilidade, gerador de conflitos sociais.

Na minha opinião, o maior risco é o ambiental. Trata-se de um problema crónico que vai agravar-se. O crescimento urbano vai continuar a reduzir a disponibilidade de terra arável. Algumas megaurbes estão próximo da rutura, com problemas nas redes de saneamento e de abastecimento de água. A qualidade da água e do ar estão ameaçadas pela poluição. A concentração de gases com efeito de estufa na atmosfera vai aumentar. A introdução da manipulação genética nas sementes, o uso imoderado de fertilizantes e pesticidas vão ter consequências na saúde das pessoas e na qualidade dos solos agrícolas. A extinção de espécies em terra e no mar vai destruir equilíbrios conseguidos ao longo de milhões de anos!

Passados seis anos não posso dizer que estou mais otimista... Creio que, em geral, estamos todos mais realistas...

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